Todo mundo tem um amigo, ou talvez você mesmo seja desse tipo, que entende tudo de primeira: vai na aula, não anota nada e mesmo assim manda muito bem na prova. Ao mesmo tempo, para vários outros de nós o conhecimento leva mais tempo para ser absorvido – em horas e horas de estudo.
Parece intuitivo que exista algo relacionado à facilidade de aprendizado, que chamaremos aqui de habilidade cognitiva, que ajuda a ir bem nas provas, por exemplo. Apesar disso, com uma boa dose de persistência, mesmo aqueles que tem menos facilidade de aprendizado conseguem obter bons resultados.
Esta persistência nos estudos, neste caso, seria uma habilidade não-cognitiva, ou, habilidade socioemocional. Esse assunto tem tudo a ver com a prova da Anpec, como vamos ver mais para frente no artigo.
Faz já bastante tempo que a literatura de educação (e também da economia da educação) consideram estes dois conjuntos de habilidades – cognitivas e socioemocionais – como complementares para determinar o sucesso pessoal e profissional de um indivíduo. Um artigo bem interessante, chamado “Hard Evidence on Soft Skills” dos autores James Heckman e Tim Kautz, mapeia a correlação existente de diversas combinações de habilidades cognitivas e socioemocionais com resultados profissionais como salário e escolaridade atingidos; além de resultados pessoais como envolvimento em crime ou gravidez na adolescência.
De fato, as evidências a respeito da importância das habilidades socioemocionais são bastante abundantes. Um dos testes mais antigos e robustos a este respeito trata-se do “Teste do Marshmallow”. Neste, pesquisadores colocavam um Marshmallow, um doce comum nos Estados Unidos, na frente das crianças e diziam que se elas resistissem à tentação de comê-lo na ausência do pesquisador, receberiam uma recompensa.
Vocês acreditam que as crianças que resistiram à tentação de comer o Marshmallow e esperaram pela recompensa foram exatamente as que quando adultas apresentavam, em média, maiores salários? Parece então, que pequenas habilidades ou traços de personalidade, que se apresentam logo na infância, podem ser grandes determinantes da nossa trajetória de vida.
Mas, o que são então essas tais Habilidades Socioemocionais?
É um conjunto de habilidades que alguns psicólogos costumam agrupar em cinco grandes domínios de personalidade, os chamados Big Five.
- Abertura a novas experiências: relacionado à habilidade como criatividade e curiosidade.
- Conscienciosidade: uma característica de pessoas responsáveis, organizadas e esforçadas. Um dos traços de personalidade mais correlacionados com aprendizado.
- Extroversão: habilidade de socialização, de entusiasmo e autoconfiança.
- Amabilidade: tendência à cooperação e empatia. Habilidade de se colocar no lugar do outro e ser tolerante.
- Estabilidade Emocional: consistência emocional sem alterações bruscas dos sentimentos ou do humor. Evitando comportamentos impulsivos ou introspectivos.
Além destes cinco domínios, existe um outro conceito socioemocional bem em moda relacionado ao mindset das pessoas é o chamado de lócus de controle.
Lócus de controle tem dois polos: dizemos que uma pessoa tem comportamento internalizante ou externalizante. Em linhas gerais, esta habilidade mensura a capacidade do ser humano de se considerar responsável pelos eventos que lhe ocorrem.
Alguém com lócus de controle interno tende a se ver como protagonista da própria vida, entendendo que é o principal responsável tanto pelas situações boas quanto pelas ruins que enfrenta no dia-a-dia.
Por outro lado, uma pessoa com lócus de controle externo tende a achar que a achar que o universo está contra elas quando algo dá errado e que quando alguém teve sucesso, foi questão de oura sorte.
Quando falamos das habilidades socioemocionais como traços da personalidade de alguém fica a sensação de que, então, não podemos alterar estas características.
Quem nasceu introvertido, por exemplo, passaria a vida inteira como sendo uma pessoa introvertida. Apesar dessa intuição, as evidências científicas mostram que as habilidades socioemocionais são altamente maleáveis e que podem ser treinadas, ensinadas e aprendidas.
A parte mais fácil de mudar é a autopercepção e o autoconhecimento. Depois disso, alguns pequenos hábitos podem nos ajudar a melhorar nossas habilidades não-cognitivas.
Habilidades Socioemocionais e a Prova da Anpec
Será que quem vai melhor na Anpec tem melhores habilidades socioemocionais? Sim, provavelmente sim!
De todas as provas, a Anpec é uma das que mais explora as nossas habilidades não-cognitivas. Aprender a teoria obviamente é muito importante, mas um bom desempenho na Anpec depende também de outras habilidades.
Entender como estas habilidades podem influenciar o desempenho na prova da Anpec tem implicações tanto sobre o nosso período de estudo quanto sobre o nosso comportamento no dia da prova.
No estudo para se preparar para prova:
O estudo para a prova da Anpec, como quase todo estudo, depende de grande disciplina, ou na nossa nova terminologia: alta conscienciosidade.
É necessária uma boa dose de foco para passarmos vários meses estudando. Fazemos isso, exatamente porque temos em mente a recompensa que queremos com isso.
Ir bem na prova da Anpec significa ingressar em um centro de pós-graduação (mestrado ou doutorado) e adquirir um conhecemos que gostaríamos de ter. Seja pela curiosidade intelectual, pela expectativa de empregos mais específicos ou por maiores salários.
A primeira dica, portanto, trata-se exatamente deste exercício: entender os seus motivos pessoais e o que você pretende alcançar depois da Anpec pode tornar o processo do estudo um pouco menos penoso. É mais fácil convencer nosso cérebro a fazer coisas não tão legais quando há clareza no objetivo final.
Além disso, e ainda dentro da conscienciosidade, ter organização no estudo para a Anpec é essencial, já tem ótimas dicas aqui no site sobre isso! A prova é extensa, com um conteúdo bem abrangente, e se organizar corretamente para estudar pode ter um impacto enorme no desempenho na prova.
É essencial, portanto, fazer um cronograma de estudos bem orientado, com uma margem de segurança. Acima de tudo, é importante consultar o andamento do cronograma de tempos em tempos, para que o controle do estudo esteja em suas mãos.
Isso tem bastante a ver com Lócus de Controle Interno. Reconhecer que o seu desempenho na prova depende em grande medida do seu próprio estudo e não de coisas aleatórias como a sorte ou o julgamento subjetivo de alguém é importante para motivar tanto o planejamento quanto o estudo em si.
Esta habilidade de planejamento, e principalmente de seguir um planejamento, vem com o tempo e com a prática. Se isso é algo difícil para você, antes de fazer um cronograma global do seu estudo para a Anpec, comece devagar: faça um cronograma de estudos para um dia específico de estudo/trabalho. No final do dia, seja crítico sobre o seu desempenho em relação ao proposto. Entenda se o que faltou foi produtividade ou se o cronograma estava realmente irreal.
Fazer isso diariamente por algumas semanas ajuda muito em criar o hábito do planejamento. Além disso, criar recompensas pessoais para quando o cronograma é cumprido pode funcionar como uma motivação extra no dia-a-dia.
Falando em produtividade, é claro que esta é uma outra habilidade que influencia muito o quanto conseguimos extrair do tempo que passamos estudando e que pode contar muito para o desempenho final na prova.
O segredo nunca será passar muito tempo estudando, mas sim aproveitar o tempo que se tem de forma bem ativa. Distrações, principalmente o celular, acabam fazendo com que a produtividade caia e nosso foco pode ir embora depois de alguns dias improdutivos.
Tem aqui no site algumas dicas legais para manter uma produtividade alta durante o trabalho. O Douglas e a Liz sempre sugerem um aplicativo bem legal, que nos estimula a ficar longe do celular nas horas que estariam designadas para estudo (leia aqui!).
Além disso, uma outra técnica, ligada à concentração, que hoje em dia está bem famosa é chamada de mindfullness pode ajudar muito. Este é um termo utilizado para expressar uma presença mental.
Seres humanos tem muita capacidade de pensar em muitas coisas ao mesmo tempo. É comum estarmos pensando “na morte da bezerra” enquanto tentamos ler um texto chato de microeconomia, por exemplo.
O estado de presença mental tenta silenciar ao máximo a nossa própria mente para que o foco vá para o que é mais importante naquele momento: o estudo. Há muitas técnicas que podem ajudar com a nossa concentração, como meditação, respiração ou mesmo o uso de pausas estratégicas no estudo. É questão de testar o que funciona para você e para o seu estilo de vida.
Na Hora da Prova:
Estudamos, nos preparamos por meses, fizemos exercícios, simulados, e finalmente chegou o momento da prova. Neste momento, as habilidades socioemocionais podem ser ainda mais decisivas, especialmente na prova da Anpec.
Para começar, tem obviamente o controle emocional ou Estabilidade Emocional. Conseguir não pirar quando o tempo tiver passando rápido ou quando não conseguirmos resolver uma questão é essencial. Caso algo assim aconteça com você durante a prova aposte nas técnicas de concentração, como meditar ou respirar. Tome água e volte para prova quando estiver pronto.
Em particular, tem uma respiração bem simples (eu chamo de “quadradinho”) que funciona oxigenando o cérebro e acalmando a frequência cardíaca – tudo o que queremos num caso de pânico durante a prova.
Funciona assim: inspire o ar por 2 segundo, mantenha o pulmão cheio por mais 2 segundos, expire o ar em 2 segundos e mantenha o pulmão vazio por 2 segundos. Você pode ir aumentando o tempo de acordo com sua capacidade respiratória, ficando, por exemplo, 4 ou 6 segundos em cada um dos estágios. Repetir esse ciclo respiratório 2 ou 3 vezes deve ser o bastante para conseguir voltar para as questões!
Além da estabilidade emocional, a prova da Anpec tem uma particularidade muito importante: precisamos de senso crítico na hora de deixar ou não um item em branco!
Como uma resposta errada em um item anula uma resposta correta é necessário desenvolver uma métrica de certeza para julgar quando responder ou não um item. Existe uma habilidade socioemocional chamada de Controle Inibitório que é essencial para resistirmos ao impulso de responder a prova completamente, mesmo os itens que não temos certeza o bastante para isso.
Controle Inibitório é bem fácil de entender quando pensamos naquela brincadeira de criança em que, por exemplo, quando alguém diz “cabeça” a criança deve colocar a mão nos joelhos.
Esta é uma habilidade que freia um instinto inicial natural, que no caso, seria colocar a mão na cabeça, e ainda, exige uma outra habilidade chamada de Memória de Trabalho, em que no processo decisório a criança ainda precisa se lembrar em que local deve colocar a mão quando ouve o comando “cabeça”.
Treinamos estas habilidades desde crianças com diversos jogos e brincadeiras, como aqueles em que “Azul” vem escrito na cor amarela e temos que dizer alta a cor da fonte e não a palavra escrita.
Na prova, tomar a decisão de deixar uma questão em branco exige um equilíbrio entre o medo de errar e a confiança na resposta. Na época de estudo devemos treinar essa habilidade de controle inibitório e fazer simulados sempre, não tentando responder todas as questões, mas respondendo apenas aquelas que responderíamos no momento da prova. É no estudo que criamos e calibramos a métrica de certeza que pode nos ajudar durante a prova.
Mas… e se na hora da prova a gente pirar, sem saber se devemos responder ou não?
Daí, volte dois parágrafos e se acalme, deixe a questão em branco e, se sobrar tempo no final da prova, volte para analisar melhor a confiança que você tem na resposta que daria.
No entanto, pode ser que, durante a prova, quando o cansaço chegar (e ele vai chegar) você saia respondendo todas as questões, mesmo aquelas que não tem certeza o suficiente. Depois desse artigo, no entanto, você já está mais preparado e tenho certeza que não vai deixar o cansaço, nem mais nada, te fazer perder o controle inibitório!
Boa Prova! =)
Esse artigo foi escrito pela Gabriela Fonseca.